24 abril 2018

25 de Abril


No dia 25 de Abril de 1974 eu era um ano e tal de gente e a minha mãe assustou-se por saber o meu pai nas ruas. Sabia-se lá o resultado do que se passava!...
Cresci num ambiente de debate político aberto e de participação em comícios, desfiles e festas do Avante. O meu pai votava no PCP e ensinou-me a curiosidade, que rima com busca pela verdade. E o espírito crítico. E a tolerância. Fui criada entre foices e martelos, póster de Sérgio Guimarães no escritório, cravos vermelhos e músicas do Zeca, do Adriano, do José Mário Branco, do Fausto. Fui incentivada a fazer o meu juízo. Não encaminhada para votar igual. E isso eu considero admirável.
Lembro-me de me sentir alta às cavalitas do meu pai e julgar o Álvaro Cunhal baixo, quando lhe observei a cabeça tão alva, de cima, num qualquer comício ou festa. O meu pai não era alto; mas eu tinha uns 6 anos... e aprendia a participação cívica e a prossecução dos sonhos, a par da letra da canção do Manuel Freire, escrita pelo António Gedeão..
Os dias da Festa do Avante eram de muitos km percorridos sobre o pó, de goulash à húngara, de concertos e numerosos encontros. Sempre o “tu” no trato com os outros, fossem eles quem fossem, tivessem a idade maior ou mais curta. Ficou-me a facilidade em tutear, prorrogada por uma profissão onde, tanto tempo depois, todos o fazíamos. A democracia na humanidade.
Chegávamos a casa com terra por todos os poros e orifícios, derreados mas contentes. A banheira era quem reclamava, em lágrimas castanhas.
Cumpri o meu instinto de marchar pela liberdade na maioria dos anos. Antes e depois de perder o pai. Há poucos anos, já a minha mãe se cansava com relativa facilidade, ainda fomos as duas para a Avenida, com um cravo cada uma. Um dos muitos momentos que agora lembro com nostalgia.
Aos meus filhos, mostrei programas alusivos ao 25 de Abril. Falei-lhes do tempo presente e do passado. Fomos, com a minha mãe, aos concertos do Fernando Pereira e dos Real Companhia no Centro Olga Cadaval quando Sintra ainda marcava a data, com um presidente de câmara de outra cor política, meu ex-professor. O choro denunciava a saudade e o sono teimava em não vir quando regressava a casa. Só me ocorriam “flashes” dos momentos em que, em família, eu e os meus pais festejámos a liberdade.
Esta é uma data que me diz tanto. A data que escolhi para criar o meu blogue, "Escrito a Quente", há 11 anos. Que me recorda o sonho e me molha o olhar.
O primeiro 25 de Abril em que os meus pais estão já ambos noutro plano.

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