25 agosto 2016

Mais um sonho realizado (I)

A noite foi brava. Uma trovoada que nos acordou, 
chuva inesperada para uma época quente de Agosto.


O dia acordou sem cor, a temperatura baixara drasticamente e o ambiente, a lembrar o Inverno, fez-nos duvidar se seria o momento para concretizar o sonho de ir conhecer a Berlenga.
Mantivemos o plano e pusemo-nos a caminho.
Estava bravo, o mar. O vento mandava na embarcação, que avançava como que embriagada.


À partida, foram distribuídos saquinhos para o enjoo. Alguns dos
 passageiros acabaram por lhes dar uso. 
Os lugares não foram todos ocupados; calculo que o dia não terá parecido convidativo a muita gente.


 Ao atracar, ninguém pareceu, contudo, ligar ao clima. 
A curiosidade era maior e o facto de estar menos calor podia jogar a nosso favor.


 Estranhámos ver tantos barcos mesmo junto da única praia da ilha. 
Lamentámos o odor a combustível.


 Depois, fomos à descoberta.



 A ilha é reserva natural, pelo que gaivotas, cagarras, albatrozes e outras aves são quem manda.
E sentem-se seguras entre os humanos; andam por entre as pessoas como se fossem cães.


A transparência da água do mar convida-nos.
A sua temperatura, nem tanto...

16 agosto 2016

Foi há três anos


Era a mais carismática das filhas do Sr Champlon.
Deixou-nos faz hoje três anos, mas gozou oitenta e um duma vida cheia.
A audácia que a fazia levar cobras de rio para casa na infância, fê-la, já adulta, percorrer o mundo sem falar qualquer idioma estrangeiro. A determinação que a levou por terras recônditas dum Portugal estagnado para ensinar as artes das linhas com que as senhoras cosiam, foi a mesma que lhe serviu de trincheira no combate contra uma doença que ameaçava levá-la em curtos meses. 
A nossa proximidade era inversa à diferença etária. Tínhamos uma cumplicidade que raras tias e sobrinhas terão. Não deixámos nada por viver, fizemos tudo quanto podíamos, juntas: viajámos, desabafámos, rimos, chorámos, pregámos partidas, desentendemo-nos, planeámos, concretizámos. A nossa verdade era crua; o carinho, espontâneo.
Podemos não ter sido as melhores tia e sobrinha do mundo. Fomos o melhor que soubemos.
Não venham dizer que está em cada boa memória; eu sei que está. Mas às vezes, lamento não a ouvir gargalhar, nunca mais.




07 agosto 2016

Férias


Tudo começou com uma tempestade encenada. Muita gente, o madeirame do palco tonitroante, num azul inquieto. A história parecendo realidade. O teatro que me entrou no sangue numa disciplina dos tempos de liceu.
Depois, o improviso levou-nos por estradas onde o Sol parecia derreter qualquer tipo de vida. Árvores prometendo sombras que logo o avançar da viagem dissipava. Vilas sucedendo-se num desfile de vaidades justificadas. O adivinhar de tanto que está por descobrir, num país que tem diversidade paisagística na razão inversa da sua dimensão reduzida.
O deslumbre pintado de verde e esculpido em xisto. A realidade imitando os cenários.
Um reencontro onde a conversa tenta condensar o que a distância ocultou. Vilas históricas onde nos imaginamos medievais, sentimos outros tempos sob a pele, reacendendo memórias que não vivemos, batalhas que outros travaram para hoje sejamos o que somos.
O cansaço acumulando-se, a sede acompanhada das chamas que, bem próximas, consumiam o arvoredo da montanha sagrada. Ali, o combate era outro; a paisagem trocara o belo pelo inferno. Que a vida também tem disto: a devastação no mais lindo quadro. O lamento em dias de harmonia extrema.
De quilómetros e de belezas se fazem os momentos que sobrepõem as nossas vidas. Consolidamos afecto e memórias. Para que, mesmo nos dias sem história ou nas horas de perda, o espanto de existir volte a lembrar-nos quem somos. E o muito que vivemos.

LinkWithin

Blog Widget by LinkWithin