21 setembro 2012

Com Alzheimer não se brinca...

Se há palavra que não gosto de ouvir pronunciada à toa, essa palavra é “Alzheimer”.
Quantas vezes dita quando alguém constata ter-se esquecido de algo, nem sempre se referindo ao nome em si mas, em jeito de piada, “já deve ser o amigo alemão”.
Não acredito que quem já sentiu a dor do Alzheimer, aquela que mora cá dentro para sempre, possa sequer pensar em associar um simples lapso ao pesadelo duma demência como esta e com ela tentar ser engraçado.
Não é uma memória enfraquecida. Não é a incapacidade de fazer contas. Não é a desorientação, nem a perda da noção do perigo.
Alzheimer é uma doença incapacitante, sem cura e que apaga tudo.
Apaga da mente de quem dele padece a capacidade verbal, a noção do dinheiro e dos números, a autonomia.
Alzheimer transforma uma pessoa num ser que deixa de reconhecer quem ama, passa a não saber cuidar de si mesmo e termina sem ser sequer capaz se alimentar e beber, isso é um inferno.
Viver de perto a doença de Alzheimer é ver um pai, uma mãe, alguém que nos é tudo, pôr a mão num tacho com água ao lume sem saber do perigo desse gesto, enfiar os dedos numa tomada, guardar sapatos na gaveta da roupa interior. É olhar nuns olhos que nos deram vida e ver só ausência. Nem pingo da pessoa que foi. Um modelo que tivemos, convertido em bebé grande, num corpo que definha e adoece com outras mazelas. São infeções respiratórias e renais, sucessivas, é o perigo das escaras quando as pernas já não têm ligação ao cérebro que as comandou, é a incontinência dum organismo que entrou em colapso.
Alzheimer é a dor duma doença que deixa os familiares cuidadores ao abandono. Porque os restantes familiares se afastam “prefiro lembrar-me dele(a) como era..”, porque as dúvidas são mais que muitas, a angústia sufocante e a revolta infinita. Não há uma resposta social para quem tem Alzheimer na família, e deixa de haver apoio emocional para quem quer ter de volta o que já não retorna.
O futuro torna-se aterrorizador, o presente impossível.
Alzheimer é um monstro mau, pior que todos os terrores duma infância normal.
É o nosso sorriso roubado, a vida sem sentido, o luto antes do luto.
(Publiquei anteriormente alguns posts sobre este tema, que podem ser visualizados ao clickar na barra lateral direita sobre a etiqueta “Alzheimer”)

3 comentários:

João Rosário Matos disse...

Faço minhas, as tuas palavras, Sofia. Conheço bem de perto esse "Monstro mau", quando vejo o "sorriso roubado" à minha querida mãe.

Mª João C.Martins disse...



"Um luto antes do luto"...

A dor de sentir morrer a alma que amamos num corpo que ainda vive.

Um beijo para ti, minha amiga.

A.S. disse...

É demasiado penoso o outro lado da vida Sofia... por isso, vivamos intensamente todos os bons momentos que a vida ainda nos dá!


Beijo,
AL

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