21 janeiro 2015


Sentavam-se no murete que rodeava o canteiro da estação.
Esperavam o comboio. Sabiam esperar. Eram tempos com tempo.
Aguardavam pacientemente o desenrolar dos momentos, alheios ao calor e a qualquer sinal mundano. Ou melhor: totalmente enquadrados no mais natural cenário. Como se fossem partículas de poeira, que o voo das andorinhas agitava quando se elevavam até aos beirais. Ou borboletas, flores, átomos primaveris.
Naquele assento improvisado, que era seu por costume e por gosto, falavam de nada, num tanto de gestos e tão pouco de palavras.
Não desviavam a atenção para o ruído dos carros nem para a rotina vestida de gente que, a passos enfadados, percorria a plataforma. Não se detinham no rumorejar das águas marinhas, ali onde a marginal era paralela e o mar vizinho dos carris.
Adivinhava-se-lhes uma cumplicidade mais certa que o sangue. A menina atenta aos bichos-de-conta, que gostava de sentir rolar na mão enquanto se não ouvisse o silvo metálico. O pai, participando no estudo dos movimentos circulares dos pequenos crustáceos, acompanhando a filha num ritual quase silente, de quem se conhece muito além do que se diz.
A espera nunca era longa. Os olhos seguiam os rastejantes casuais por entre os desníveis das pedrinhas e os seus planos mais lisos, onde as formigas seguiam, por vezes, um trilho diferente, bem definido.
Não havia horas, nem se ouviam altifalantes. Os restantes passageiros como que desapareciam. Só existiam pai, filha e o calor da infância.

1 comentário:

Lídia Borges disse...


Um "estar" em plenitude, como só na infância.

Bonito!

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