30 dezembro 2014

Os meus desejos para 2015



Que cada dia traga a alegria de uma promessa

Que todo o gesto enxugue as lágrimas incontidas

Que a noite te afague num carinho que não esqueça

E o vento te ofereça as alegrias prometidas



Que os impulsos dessa alma de aventureiro

Sejam passos inventados a cada nova dança

Que toda a casa albergue amor verdadeiro

E a ternura seja o espelho de qualquer criança



Que qualquer estrada desemboque num moinho

Que o presente seja um livro ou um brinquedo

Que haja sempre pão e nunca acabe o vinho

E que cada jardim conserve um segredo



Que todos possam, sempre, ouvir cantar

Essa voz doce, de eterno trovador

Que quando sentires vontade de chorar


Sejam gotas de alegria na oferta duma flor



(Desvelo, poema publicado no meu livro Antes de Sermos Dia)

24 dezembro 2014

Feliz Natal



Sobretudo, desejo que os dias, estes ou os restantes, sejam de amizade.
Desejo a todos um Natal acolhedor e uma quadra docinha. 
Porque, como costumo dizer, precisamos mais de presenças que de presentes.

10 dezembro 2014

Após um acidente sério, um balanço resumido da minha vida

Tudo começou quando fiz dezoito anos.
Queria arrumar os exames e ir para a praia. Em vez disso, receei que o cancro me levasse a mãe. Meti mãos à empreitada duma casa e pés a caminho do hospital, em Lisboa. Quase não sobrava tempo para estudar.
Nunca mais a minha mãe foi a mesma. Com a mama, perdeu uma parte importante dela.
Depois, o meu pai. Alzheimer. Os primeiros indícios aos 59 anos. Eu a ver o que a minha mãe não vislumbrava.
Anos inimagináveis de perda dolorosa. Uma solidão partilhada entre as duas. A impotência, a falta de forças.
Eu sempre longe; na indústria farmacêutica atribuíam-me, invariavelmente, o papel de papa-léguas.
A minha mãe a ligar-me porque ele caía e não conseguia levantá-lo. Eu em Rio Maior.
Mudei fraldas a um pai doente antes de ter filhos. Os fins-de-semana de assistência aos meus pais. Os filhos do meu ex-marido a fazerem, por vezes, companhia.
A minha mãe a sofrer um avc. Eu dividida entre um lar onde tivemos que deixar o meu pai, enquanto ela recuperava, e o hospital onde ficou internada.
Em casa, quase só o tempo de dormir. Roupas, cuidados, angústias.
Dez anos de despersonalização. A família ausente. Queriam recordar-se dele como era...
Eu a lembrar-me de todos, a dar notícias, a estar presente.
A minha tia acidentada, a ter de ser operada ao colo do fémur. O meu pai internado, pele e osso, com uma das inúmeras infecções que sofreu após desaprender de comer.
E, enquanto a minha mãe recuperava forças, eu, muito grávida, ia de Lisboa para a Amadora, entre hospitais, entre pai e tia, no calor de Agosto. 
Compras, chamadas de atenção. Exigia-se a perfeição.
Os últimos dois anos do meu pai num lar que mal conseguíamos pagar. O meu filho vivendo grande parte dos primeiros fins de semana em ambiente de gente debilitada, sozinha.
Sentia-me culpada quando pensava que talvez fosse preferível ele partir. Tanta culpa! Tanta dor! Mas mantinha o sorriso, conversava com ele, acarinhava-o.
Até que um dia.
Eu, gravidíssima -ainda mais que no acidente da minha tia- a atender a chamada, com o Vasco ao lado. Nunca se está preparado.
Na despedida apareceram os que não acompanharam a doença. Por breves instantes.
E tudo voltou a ser normal por uns meses. Comigo a lamentar que o Vasco perdesse a lembrança do avô.
Até sabermos que a minha tia era consumida por um cancro metastizado.
A minha bebé a começar a vida enquanto eu ficava sem emprego e receava perder a minha tia.
A separação, sem emprego.
A minha mãe sofrendo quedas e fracturas umas após as outras. 
A minha tia fintando a doença durante sete anos, com uma energia admirável.
Conseguiu ficar o tempo suficiente para os sobrinhos-netos a recordarem.
Eu e a minha mãe multiplicando-nos em deslocações e cuidados. Mesmo quando já não a tínhamos. Muitos animais e uma casa à espera das nossas capacidades.
A visão da minha mãe deteriorando-se. Uma cirurgia às cataratas a correr mal.
As dificuldades de aprendizagem da Mafalda. A suspeita duma doença rara e grave.
A dor, a solidão, a falta de recursos. E eu a continuar a apreciar a vida. A estar com todos, sem estar comigo. 
Agora, temi ficar sem mãe. Ali, em frente aos netos. Ou que ela perdesse a mobilidade, a consciência.
A solidão. A preocupação com a normalidade da vida dos filhos, em dias sem qualquer normalidade.
Tenho um sorriso secreto, quando me falam de força, de paciência. 
Sempre as tive. 
Mantenho o riso, após tanta aflição. Privilégio de poucos.
Tenho tido de tudo em doses elevadas.
Não conto aqui.
Raros me conhecem. Sabem que não me vergo. Não ligo ao estatuto. Bato-me pelos valores que defendo. 
Paguei um preço alto. Conservei a dignidade. 
A escrita e um ocasional esgar ou resposta, são os meus equilíbrios. 
Mantenho o gosto pela vida. A criatividade de quem não pode dividir responsabilidades, pensar primeiro em si ou viajar e ainda alegra os dias.
Não escrevo humor nem lamechices. Desprezo o fácil. Aprecio os dias sem história com a gratidão e o encanto de quem sabe o que é sofrer, viver em sobressalto.
Aceito presenças, abraços. 
Conselhos? É no que as pessoas sabem ser generosas. Sou cada vez mais selectiva.

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