29 abril 2011

Carta de... desamor

Adeus! Conseguiste perder-me.
Segue a tua vida, sem olhares para trás, que eu sigo a minha. Só há uma via: em frente.
E o meu “em frente” será com alguém bem mais completo e maduro que tu.

Começaste a perder-me assim que percebi que não podia beijar-te em plena rua, tu sempre contido, numa discrição própria de quem não ama. Perdeste mais um pouco quando os meus olhares eram só para ti e os teus eram… para todas. Continuaste a perder onde devia ter começado o prazer.

Prosseguiste o percurso de perda na única viagem que fizemos. Viagem que tu não viveste, sempre amorfo e ensonado, vai-tu-que-eu-fico-no-hotel, como se tivesses vivido ali sempre.

E foste por aí fora, perdendo-me infinitamente, à medida que conhecia a tua dependência em tudo-e-mais-alguma-coisa, criança mimada que se recusa a crescer. Pior: sem o espírito de descoberta infantil que te traria pontos a favor, em matéria de intimidade. Matéria que encaras com uma falta de imaginação que o tempo não superou, como um manual que obedece a fórmulas inquebráveis. Como se o amor fosse uma ciência exacta…

Perdeste-me até nada restar daquele encanto inicial, que me prendeu pela simpatia, pelo sorriso, pelas palavras certas no momento apetecido. Tudo podre, ao fim de uns quantos meses…

Contigo, aprendi que não vale quando não há improviso, que não prende quando não nos faz libertarmo-nos das convenções, que não é especial se não nos faz sentir em pleno voo de descoberta.

Por tudo isto: esquece-me. Que eu comecei a esquecer-te assim que me apercebi do teu mundo limitado, da tua insegurança trajada de conquistador, da tua conversa que se esgota rapidamente…

Agora sou co-protagonista dum amor inteiro. Segue a tua vida. Que eu dei em estudar ciências instintivas…

25 abril 2011

25 de Abril sempre

Eu era apenas um ano e tal de gente, pequena demais para me aperceber quando o 25 de Abril aconteceu.
Não sabia que o meu pai tinha ido para Lisboa, em busca dos acontecimentos que as notícias diziam revolucionários. A minha mãe, em casa comigo, receava pelo que pudesse acontecer, temendo um volte-face na situação, mesmo alguma escaramuça...
A minha memória dos 25 de Abril subsequentes prende-se com aquele brilho no olhar dos meus pais, com as manif's, com as canções de Abril que me fazem vibrar cá dentro as cordas da emoção e me convocam ao olhar as lágrimas cúmplices dum coração que estremece.
Esta é, para mim, a data. Marca-me de tal forma que a escolhi para criar o Escrito a Quente, há quatro anos.
Porque a liberdade é essencial à vida, como escrever se tornou essencial para os meus dias.

21 abril 2011

Estás fora deste mundo louco há 5 anos. Mas sinto-te perto. Não temos mais aquele carinho à noite, nem os serões de “cinema” ou a troca de olhares e piadas cúmplices, mas comunicamos directamente, sem doenças, cansaços ou divergências.
Escrevo-te para te dizer que estamos bem. Podes ver-nos por vezes impacientes, preocupados, exaustos, apressados. Mas estamos bem. Tu sabes…
Com saúde, sorrisos, projectos, vivacidade. E uma saudade imensa, terna, um orgulho eterno.
Convivo bem, já, com essa saudade. É como um manto macio que me envolve e me aquece, na memória de ti. Do teu aniversário recente, da tua partida definitiva. Até um dia. Sem pressas…
Um beijo abraçado. Da tua filha que, como sabes, te ama.

13 abril 2011

Deixei-te o Sorriso em Casa

Agora apanhaste-me desprevenida. Pedes-me que te aconselhe um livro para leres.


Vou fazê-lo de cor, amigo. É que já não o tenho comigo. Como sabes, ultimamente deixo os livros cá de casa desamparados na solidão numerosa uns dos outros porque não tenho comprado mais. Visito a biblioteca e eles colam-se-me às mãos, como costumava acontecer nas livrarias. Ao fim e ao cabo, são todos feito da mesma matéria, essa matéria que se me cose à pele: as palavras.

Deixei-te o Sorriso em Casa. Não deixei. É o título do livro. Começa logo aí, o meu fascínio. Que é comum a outros títulos do mesmo autor, tão desconcertantes quanto apelativos: Os Sapos Vivos Estão Pela Hora da Morte e O Pescador de Girassóis.

Faltam-me os sapos, porque os sorrisos e os girassóis já os devorei.

Começando pela razão deste livro.
Começa sempre pelos sentidos, que isto de ler, para mim, é intuição, em dose igual à paixão. Se der em romance, tanto melhor. E deu.

Para onde quer que tenhas ido, onde quer que estejas, estarás sempre comigo para além do tempo.- frase magnetizante, que só não prende quem nunca lamentou a perda de alguém. Começou, portanto, no título e nesta frase, a sedução.

Detive-me com gosto no Nuno e na sua livraria, no tio misteriosamente desaparecido, no velho feiticeiro de sorriso perdido que faz de tudo para o reencontrar, na Isabel, coleccionadora de sorrisos em parceria com Nuno, nas gémeas livreiras e cozinheiras, com um passado amoroso de caixão à cova, todos aqueles participantes das tertúlias secretas madrilenas. E na Ana, claro. Insidiosamente sedutora, mas não vou adiantar-me…

Há também os poemas de Guerra Junqueiro, as promessas por cumprir, as tentações que deitam tudo a perder, planos e amor, sorriso e coração. E os locais por onde o Sorriso me levou a passear. Mas o que me enamorou mesmo, foram as imagens. A forma inédita que as palavras assumem nesta narrativa que me empolga pelo estilo. “Não é o que dizes, mas como o dizes”- conheces a expressão? Mergulhei na leitura, repetindo a mim mesma “é assim que eu sinto; estas imagens podiam ter sido escritas por mim”. E felicitando-me pela descoberta deste criador de uma escrita deleitosa.

03 abril 2011

Escrevo isto porque sei que não lerás. Assim posso escrever o que a vida me dita, sem receio de julgamentos.
Gosto de me perder à conversa. Mesmo com desconhecidos.
Parar na rua, libertar uma qualquer frase banal e, a partir dessa, ir caminhando por um passeio de palavras incontidas, libertas pela disposição do momento. Fazer das palavras frases, deixar que me levem para ideias recém-nascidas, descobrir novas. E descobrir pessoas.
Digo-te isso aqui porque sei que não me ouves.
Assim, estou muito mais à vontade. Para descobrir, mas também para imaginar. É um dos meus muitos defeitos, estar sempre com um pé lá, outro cá. A imaginação comanda e eu deixo-me ir.
Nas minhas deambulações mentais, somos conversa que se entabula com um não-sei-quê de curiosidade, intenção misteriosa de comunicar numa liberdade refreada. O teu discurso lutando por me segurar o olhar, o meu olhar timidamente rodopiando em redor, querendo ir pousar no teu, mas sem conseguir reter-se aí. Conta-gotas de informação, os diálogos contêm sorrisos, que por sua vez contêm bem-estar, que por sua vez contém simpatia.
Sei que te fiz protagonista duma história secreta, despoletada pelas imagens que trocávamos, desenvolvida por feitiços, super-poderes e mistérios. E toda a gente sabe que as histórias de mistério nos retêm enquanto soltam a imaginação. Por isso, viajo por essas imagens, sem visto nem passaporte, sozinha num programa que defino de improviso.
E to conto, assim, onde não adivinhas que mora este desabafo feito de sorrisos interiores. Que são os mais sinceros, porque são os que ninguém vê e, assim, eles podem soltar-se sem constrangimento.
Cada amigo que descubro é um metal precioso que acrescento a esta liga de que a vida é feita. É engraçado pensar que vais fazendo parte dela sem sequer suspeitares. E é bom deixar a minha liberdade de espírito voar por aí, fazendo de ti o super-herói que não és, descobrindo-te sem te conhecer, traçando-te rumos que não tomarás. Digo-te isso aqui porque sei que não lerás. Porque estou muito mais à vontade. E porque não sou talhada para contos onde os super-poderes se cosem à magia romântica que falta no dia-a-dia. Por isso, e porque, como todos sabem, há histórias que devem ficar em suspenso, não darei seguimento a esta, que fica sem ponto final

LinkWithin

Blog Widget by LinkWithin