A 22 de Abril de 1920 nascia o meu tio Alberto. O primeiro de oito filhos de um casal que acabou por ficar apenas com este filho e três filhas, tendo perdido os restantes logo nos primeiros meses de vida.
O meu tio nasceu em Lisboa, mas foi vivendo aqui e ali, consoante o trabalho do meu avô, para a Junta Autónoma de Estradas, exigia. Moraram em Coimbra, no Porto, em Mértola e por fim em Silves, onde concluiu a instrução secundária.
Tal como o pai, também Alberto se empregou na JAE.
Casou com Maria Isabel Tenente aos 24 anos, em Ponte de Sor,
onde o casal ficou a residir. Por pouco tempo.
Os dias eram rotineiros, o trabalho pouco exigente e a sua
ânsia de fazer mais e de ser melhor fizeram-no aspirar a outros desafios. Candidatou-se
à Diamang e, em Fevereiro de 1948 embarcou no Quanza, rumo a Angola.
Pelas centenas de cartas que o seu pai guardou, senti que o
conheci quase melhor que as irmãs, mais novas uns anos valentes. Soube como a
estranheza inicial deu lugar a um entusiasmo crescente. Rapidamente o trabalho
na Contabilidade era História e o meu tio passara a ser “homem do mato”, começando
a trabalhar na prospecção.
Vivia em casas de pau a pique, algumas com diversos quartos
e com frigorífico, em pleno mato, em 1951.
Liderava o trabalho de equipas de nativos, caçava (sobretudo
para alimentar os seus homens) e fazia o levantamento de zonas vastíssimas,
onde por vezes nenhum branco havia sido visto.
No Dundo aprendeu a guiar, embora o seu dia-a-dia consistisse
em caminhar dezenas de quilómetros e prospectar. Adquiriu noções de primeiros
socorros, tratou e foi tratado. Injecções de quinino e todo o material de
assistência básica acompanhavam aqueles homens por todos os pontos onde
assentavam por uns tempos.
O casamento não deu certo e Alberto acabou por se sentir ali
tão bem quanto os leões ou os macacos. Convivia por vezes com outros prospectores
e com os elementos da equipa de Geologia e só esporadicamente com outros
empregados e suas famílias, nos “lupangos” mais próximos de onde se encontrava.
Descobriu o maior kimberlito da história até então, o que
ficou documentado em publicações internacionais da especialidade. Mas também se
apercebeu de alguns desvios, o que talvez tenha estado na origem dos ocasionais
desaparafusamentos de porcas dos pneus do Land Rover que conduzia.
Passou a viver com um mini zoo, onde havia sempre espaço
para mais algum animal, enquanto algum acabava por morrer. Se, na metrópole, já
gostava de filatelia, no Dundo apaixonou-se pela fotografia e vídeo. Encomendava
câmaras, rolos e filmes do estrangeiro.
Colaborando frequentemente com o laboratório de Biologia da
companhia, acabou por se dedicar também ao embalsamamento. Encomendava câmaras,
rolos e filmes do estrangeiro.
Nas férias, vinha ao “Puto”, rever a família e fazer tratamentos
na termas, indo também a Espanha e Marrocos.Morreu subitamente, sem descendência conhecida, naquele que
planeava ser o último contrato, quando o Land Rover onde seguia entre Xá-Mutemba
e Iogo capotou, poucos dias após completar 44 anos.
Deixou desolado o pai, já viúvo, e as irmãs, todos órfãos de
um corpo a quem fazer as exéquias.
Foi o meu tio quase mítico. E hoje, quis lembrá-lo, mesmo
sem ter chegado a conhecê-lo pessoalmente.
1 comentário:
Terá sido feliz por ter vivido como gostava e isso é o que importa.
Abraço, saúde e bom fim de semana
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