23 setembro 2009

Excerto #2

(fotograma captado por mim, de um filme do meu tio. Anos 50, na Lunda)


O trabalho nos dias de semana terminava mais cedo que na mina. Porém, o serviço era completamente diferente e perigoso. Cada mês conhecia bastantes quilómetros de levantamento topográfico, feito à bússola. Desenhava muito, o que era do seu agrado.
O seu mundo resumia-se agora a uma placa africana de uns dez quilómetros de raio, bem povoada de bicharada, sendo a sociedade um pequeno número de nativos. Sentia-se bem, vivendo isolado como desejava. A vida era trabalho e caça, leitura e sono.
O trabalho, não sendo muito, tinha o senão de se tornar, por vezes, incómodo, já que implicava a passagem por pântanos. Os sapatos de ténis tornaram-se o calçado rotineiro.
Aos fins-de-semana, inicialmente, Alberto ainda se encontrou com Marques e ensaiou umas lições de condução. Depois, porém, foi avançando no levantamento topográfico, em direcção ao Fundulo e a distância aumentou, não permitindo tais encontros.
Era a Natureza quem imperava naquelas paragens.
Planícies inteiras ficavam por cultivar, devido à presença do leão. A Sul, no Quando, leões e elefantes punham em estado de sítio a região.
- Acudam, socorro!
O grito provinha de um branco, na Vila Gago Coutinho. A fera abocanhava um jovem, num tumulto espalhafatoso de sacudidelas e berros. O tempo pareceu arrastar-se sem fim, naqueles breves instantes em que uma multidão de nativos e brancos se acercou da fera e da sua vítima, soltando clamores e atirando pedras. O animal avaliou rapidamente a sua inferioridade táctica e pôs-se ao fresco, deixando para trás o indivíduo, mal tratado mas livre de perigo.
A seiscentos metros do acampamento, também já Alberto vira um casal destas feras, num aviso implícito aos homens que exploravam o seu território.

11 comentários:

plm disse...

Deverá dar continuidade ao livro, ainda, em esqueleto e prosseguir, arduamente, o projecto idealizado. Só falta, segundo sei, juntar as partes em falta do esqueleto e dar mais "corpo" à obra idealizada.
Aguardamos outros excertos.
Cumprimenta,
plm

Elvira Carvalho disse...

Vejo que retomou estes textos de Angola, que tanto me encantam.
Parabéns. É uma óptima decisão.
Se um dia (e espero que o faça em breve)publicar um livro eu estou na fila para o comprar.
Um abraço

Carlos Albuquerque disse...

Saúdo este retomar da escrita com sabor à Angola africana.
Aguardo continuação...
Um beijo

FOTOS-SUSY disse...

OLA FILOXERA, BELISSIMO TEXTO, GOSTEI...
UMA OPTIMA NOITE!!!
BEIJO DE CARINHO,


SUSY

A OUTRA disse...

Ah!...
Vai ser assim?...
Bj
Maria

Maria disse...

É com um sorriso enorme que te deixo um beijo, hoje...

Patti disse...

O fascínio que África desperta em todos...

Anónimo disse...

Apesar de ter andado em tanto mundo, quase não conheço a África sub-sariana, mas é enorme o fascínio que me provoca tudo o que leio a respeito desse continente.

Gi disse...

A retoamres as tuas rotinas?

O que me fascina é conseguir sentir no que escreves o cheiro e o pulsar da minha terra sem tu nunca lá teres estado. ;)

jo ra tone disse...

Força Filó, com esse livro.
Um meu já se encontra alinhavado.
Beijnho

gaivota disse...

não sabia que tinhas "a ver" com angola... vou-te enviar um mail, talvez conheças, mas está bonito.
luanda há 2 anos, foi uma desilusão!
beijinhos

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